‘Resposta’ à condenação de Bolsonaro prometida por secretário de Trump pode ocorrer durante viagem de Lula aos EUA
Marco Rubio cita ‘juízes ativistas’ e afirma que caso contra Bolsonaro foi ‘mais um capítulo de opressão judicial’
Enquanto o presidente Luiz Inácio Lula da Silva se prepara para participar da Assembleia Geral da Organização das Nações Unidas (ONU), em Nova York, e discursar na abertura do encontro na próxima terça-feira, o secretário de Estado americano, Marco Rubio, sinalizou ontem que novas medidas, em retaliação à condenação do ex-presidente Jair Bolsonaro pela trama golpista, serão anunciadas na “próxima semana”. Rubio, que comanda a diplomacia do país, chamou os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) de “juízes ativistas” e disse, sem citar nominalmente Alexandre de Moraes, que um magistrado tentou “impor reivindicações extraterritoriais contra cidadãos americanos”.
/i.s3.glbimg.com/v1/AUTH_da025474c0c44edd99332dddb09cabe8/internal_photos/bs/2025/q/Q/9SAAiGSmuU7VTN5ZsJdw/111759234-us-president-donald-trump-listens-to-secretary-of-state-marco-rubio-speak-during-a-meeting.jpg)
Após a condenação de Bolsonaro, o secretário de Donald Trump já havia afirmado que os EUA iriam “responder adequadamente” ao que definiu como “caça às bruxas”, em referência ao julgamento do aliado. Nos últimos meses, em meio à escala da crise diplomática entre os países, parte dos produtos brasileiros se tornou alvo de um tarifaço de 50%, e Moraes passou a integrar a lista de sancionados pelo país na chamada Lei Magnitsky, que impõe uma série de restrições financeiras. A resposta ocorreu após a articulação do deputado federal Eduardo Bolsonaro (PL-SP), que vive nos EUA.
A Magnitsky foi, originalmente, criada para atingir pessoas físicas e jurídicas acusadas de infringir direitos humanos ou de atos graves de corrupção, mas passou a ser usada por Trump como forma de pressionar o Judiciário brasileiro. As restrições incluíram o bloqueio de cartões das bandeiras Visa e Mastercard mantidos pelo Banco do Brasil.
Agora, Rubio indicou que o país avalia “medidas adicionais”, sem antecipar quais seriam. Na entrevista, Rubio também disse que o julgamento no STF foi “apenas mais um capítulo de uma crescente campanha de opressão judicial que tentou atingir empresas americanas e até pessoas operando a partir dos Estados Unidos”.
Você tem esses juízes ativistas, um em particular que não apenas perseguiu Bolsonaro, mas também tentou impor reivindicações extraterritoriais até contra cidadãos americanos, ou contra alguém postando online de dentro dos Estados Unidos, e chegou a ameaçar ir ainda mais longe nesse sentido — disse na entrevista, que também foi transcrita e replicada pelo Departamento de Estado. — Então, haverá uma resposta dos EUA a isso, e teremos alguns anúncios na próxima semana ou algo assim sobre quais medidas adicionais pretendemos tomar.
Reação esperada
A reação americana já era esperada por integrantes do governo brasileiro, que avaliam que, dessa vez, os anúncios podem ser sanções individuais com foco em autoridades brasileiras, como aconteceu com Moraes. Além do relator da ação sobre a trama golpista, sete integrantes do Supremo tiveram os vistos americanos suspensos, com exceção dos ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça, indicados por Bolsonaro, e Luiz Fux, único integrante da Primeira Turma que votou pela absolvição do ex-presidente na semana passada.
Interlocutores do governo ouvidos pelo GLOBO também avaliam que o presidente americano deverá recalibrar suas próximas ações com a extrema direita, a exemplo do que aconteceu com a Índia, taxada por comprar petróleo da Rússia. O Brasil, por sua vez, compra fertilizantes dos russos, mas se for punido por isso, haverá problemas com o agronegócio, base eleitoral da oposição bolsonarista. Outra avaliação é que Trump fez uma declaração branda sobre a condenação de Bolsonaro, ao dizer que considerou “terrível” o resultado do julgamento e que gosta muito do ex-presidente.
Nas palavras de um integrante do governo Lula, a imagem do Brasil perante o mundo foi bastante positiva após o julgamento de Bolsonaro e outros militares acusados de tentativa de golpe de Estado. Ficou claro que o país não cedeu à “chantagem tarifária” da Casa Branca, expressão usada por Lula em reunião com líderes do Brics, na última segunda-feira. Além disso, há questões em aberto, como a investigação americana sobre práticas desleais no comércio com o Brasil, que questiona práticas como o Pix, competidor de empresas americanas de cartões de crédito.
A Assembleia Geral da ONU, prevista para a semana que vem em Nova York, é tratada como uma das prioridades de Lula em sua agenda internacional. Em seus três mandatos como chefe do Executivo, o petista compareceu a todas as Assembleias, com exceção da de 2010. Na ocasião, Lula mandou o então chanceler Celso Amorim no seu lugar, pois estava focado na campanha presidencial para eleger Dilma Rousseff.
Neste ano, Lula também pretende marcar presença na reunião, no dia 23. Além de não ter nenhuma campanha eleitoral em 2025, a reunião será um momento chave para avançar nas negociações da COP30, que ocorrerá em novembro pela primeira vez no Brasil, em Belém.
No dia 24, a ONU sediará a Cúpula do Clima, quando os países devem anunciar as suas propostas de reduzir as emissões de gases de efeito estufa e adaptação às mudanças climáticas, as chamadas NDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas). Tradicionalmente, o representante do Brasil faz o discurso de abertura da Assembleia – o que Lula fez em 2023 e 2024.
Em artigo publicado no domingo no jornal “The New York Times”, Lula enviou uma mensagem a Trump de que o Brasil “continua aberto a negociar qualquer coisa que possa trazer benefícios mútuos”. Mas ponderou que a “democracia e a soberania do Brasil não estão em pauta”. O petista afirmou ter orgulho da “decisão histórica” do Supremo, que, segundo ele, “salvaguarda nossas instituições e o Estado Democrático de Direito.
Fonte: O Globo.com.
Foto: Brenno Carvalho/Agência O Globo.