Política

Convênio da Universidade Federal de Goiás com o Tribunal Regional Eleitoral será assinado até o fim de junho

Com o surgimento das redes sociais, em meados de 1990, começou a ficar cada dia mais difícil separar o real do virtual. As tecnologias digitais transformaram nossa percepção e interação com o mundo. Na obra The Metaphysics of Virtual Reality, Michael Heim discute como a realidade virtual afeta a percepção de realidade, identidade e espaço. Além disso, o autor aborda de uma maneira filosófica os impactos dessas transformações na natureza do ser e da existência no contexto digital.

A pandemia acelerou a transformação digital. Atualmente, robôs, drones e carros voadores não parecem distopia inimaginável, mas uma realidade cada vez mais próxima. A sociedade não consegue acompanhar o ritmo da evolução e se vê cada dia mais refém dos canais digitais, seja para busca de informações ou entretenimento. Pessoas mal intencionadas, no entanto, usam desses meios para promover discursos de ódio, disseminar informações falsas e fomentar o caos. Com as eleições de 2024 se aproximando, os órgãos públicos demonstram preocupação em regular esses canais para garantir a lisura do processo eleitoral.

Pensando nisso, o Tribunal Regional Eleitoral (TRE-GO) e a Universidade Federal de Goiás (UFG) fizeram parceria para desenvolver uma ferramenta de checagem dos fatos. O projeto se chama “ambiente integrado de compartilhamento de serviços de buscas e recuperação para análise de veracidade de informações: processo eleitoral brasileiro”.

Em entrevista ao Jornal Opção, o presidente do TRE em Goiás, Luiz Cláudio Veiga, comenta que o combate às fake news é o grande tema do momento.”Ele [programa] identifica, não dá certeza porque seria pedir demais, mas ele identifica se aquela informação, com um percentual que já foi revelado de próximo a 100%, é falsa ou verdadeira. Em seguida, encaminha para os órgãos de apuração”, pontua Veiga Braga.

Segundo ele, em toda a justiça eleitoral, e particularizando em Goiás, a grande questão debatida nos tribunais é essa. Aliás, o assunto foi tema do primeiro encontro do recém empossado presidente do TRE com a ministra Camila Lúcia no dia seguinte à posse dela como presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O convênio da UFG com o TRE será assinado até o fim de junho. “O objetivo é avaliar a capacidade dessas ferramentas em fornecer meios e recursos que facilitem essa descoberta [das notícias falsas] e combater às fake news”, explica Eliomar Araújo de Lima, coordenador do projeto e diretor do Instituto de Informática (INF-UFG).

De acordo com Eliomar, a 1ª versão será lançada dois meses após a assinatura do convênio. A medida funciona como um projeto piloto para teste e avaliação da capacidade tecnológica da ferramenta. Após a certificação dessa versão, a solução será disponibilizada na Web para acesso dos usuários, que poderão contar com um painel (dashboard) para consultar ou realizar análises de veracidade de informações.

O coordenador do projeto explica que a ferramenta estará disponível para uso até a data das eleições. “De início, durante essa 1ª versão, somente os servidores do TRE poderão acessar. O programa consiste em um portal/painel onde vão constar as postagens suspeitas e que foram avaliadas por uma IA que faz parte dessa solução tecnológica”, destaca Eliomar Araújo.

Checagem de fatos

O programa funcionará como uma espécie de verificador de postagens suspeitas, distorcidas e fora de contexto. “A tarefa de checagem é uma das principais. Vamos utilizar toda a base já existente de postagens das agências e elas estarão disponíveis para facilitar o acesso à informação”, pontua Eliomar. O grupo de pesquisa é composto por mais de 20 pessoas, vinculado ao Centro de Confiança Digital, Estruturas Críticas Abertas e Cibersegurança – C4TIC do Instituto de Informática da UFG.

O grupo de pesquisadores vem atuando com trabalhos nessa área há um tempo e vem desenvolvendo um projeto financiado pela FAPEG (Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de Goiás) e ANATEL (Agência Nacional de Telecomunicações). Apesar dos projetos não terem sido voltados para o processo eleitoral, eles estudaram a mesma temática para o desenvolvimento.

Aquelas postagens nas redes sociais que não passaram por checagem de agência vão passar por um score, uma ferramenta que vai gerar explicabilidade e informar quais parâmetros levaram a tomada da decisão. “Ela não faz sozinha a checagem, mas apresenta elementos para subsidiar o tomador de decisão”, alerta o diretor do Instituto de Informática.

Para realizar uma análise de evidências e buscar elementos críveis em um processo de checagem de notícias, é possível utilizar uma ferramenta de monitoramento e busca na internet que identifica notícias falsas.

A ferramenta, desenvolvida pela UFG em parceria com a Anatel, atribui um valor entre 0 e 1 para cada notícia analisada, onde valores mais próximos de 1 indicam alta probabilidade de ser fake news e valores mais próximos de 0 indicam alta probabilidade de ser fato. Um valor próximo de 100% (ou 1) tende a indicar uma notícia falsa. “Funciona como um mecanismo de checagem semiautomático”, propõe Eliomar Araújo.

Para assegurar a credibilidade do sistema eleitoral e combater fake news, ferramentas como essa são fudnamentais. Elas detectam e corrijem a distorção de imagens e vídeos usados para prejudicar a imagem de candidatos.

Esses conteúdos, muitas vezes gerados ou alterados por Inteligência Artificial (IA), precisam ser identificados com precisão. O aprimoramento dessas ferramentas inclui monitorar o comportamento de disseminação de desinformação, realizar correções e propor evoluções constantes no sistema, garantindo uma resposta eficaz às manipulações digitais que buscam influenciar o processo eleitoral.

Iniciativa é pioneira

De acordo com Luiz Cláudio Veiga, o TRE-GO vai ser o primeiro tribunal eleitoral do país a contar com esse tipo de programa. “Nem o TSE ainda não tem nenhum aplicativo para combate às fake news. A Universidade Federal aqui está muito avançada em tecnologia”, destacou o presidente do Tribunal Regional Eleitoral.

A Universidade Federal de Goiás e o Instituto de Informática formara, em março deste ano, a primeira turma de Inteligência Artificial (IA) do Brasil. O curso tem o objetivo de formar profissionais aptos a resolver problemas complexos por meio da Inteligência Artificial, incluindo sistemas embarcados e autônomos, de forma inovadora e empreendedora. Os 14 estudantes, que compõem a turma pioneira de formandos em IA do país, saíram da universidade empregados em grandes gigantes da tecnologia, dentre elas startups do Vale do Silício, nos Estados Unidos.

Para combater fake news contra a justiça eleitoral e candidatos, é necessário uma ferramenta de identificação eficaz. Luiz Claudio conta que, durante um encontro em Macapá com presidentes regionais eleitorais, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) do Paraná mencionou que tentou criar um programa em colaboração com a Universidade Federal do Paraná (UFPR), mas ainda não teve sucesso.

O programa buscava detectar desinformação e manipulação digital, aprimorando a integridade do processo eleitoral. Investir em parcerias acadêmicas e tecnológicas pode fortalecer esses esforços, garantindo uma resposta robusta às fake news.

“Uma rede de Fake News é a produção de mentiras pré-ordenadas em série para manchar a justiça eleitoral e dos candidatos numa concorrência que é fraticida. E hoje, essa busca para identificação requer uma preocupação redobrada com as deep fakes e as mentiras produzidas nos esgotos da internet, que geram um grau de comoção enorme”, afirma Luiz Cláudio Veiga.

O que são as deep fakes?

Deepfakes são uma tecnologia que utiliza inteligência artificial e aprendizado de máquina para criar vídeos, áudios ou imagens falsificados que parecem ser reais. O termo “deepfake” é uma combinação de “deep learning” (aprendizado profundo) e “fake” (falso).

Deepfakes são vídeos, áudios ou imagens falsificados que utilizam inteligência artificial e aprendizado de máquina para parecerem reais. A tecnologia combina redes neurais convolucionais (CNNs) e redes generativas adversárias (GANs) treinadas com grandes conjuntos de dados da pessoa a ser falsificada. As GANs geram novos conteúdos realistas, substituindo, por exemplo, rostos em vídeos e sincronizando movimentos labiais com áudio.

Esses conteúdos têm aplicações em entretenimento, publicidade e educação, permitindo efeitos especiais avançados e simulações realistas. No entanto, deepfakes também apresentam riscos significativos, como a disseminação de desinformação, violações de privacidade e compromissos de segurança, além de minar a confiança no conteúdo digital.

Para combater esses problemas, tecnologias de detecção estão sendo desenvolvidas para identificar inconsistências em mídias manipuladas, enquanto regulações legais estão sendo propostas para penalizar usos mal-intencionados. A conscientização pública sobre os perigos dos deepfakes também é fundamental para ajudar as pessoas a discernir entre o que é real e o que é falso.

Com o uso de IA, é possível criar vídeos realistas de pessoas famosas dizendo qualquer coisa desejada. A tecnologia de deepfake permite inserir rostos e criar áudios que replicam com precisão o sotaque, timbre e velocidade da voz original. Segundo Sartori, todas as características da voz são copiadas e reproduzidas, criando um novo contexto ou história. Essa capacidade de manipulação levanta preocupações significativas sobre a propagação de desinformação e a integridade das informações visuais e auditivas compartilhadas publicamente.

Nas eleições de 2022, por exemplo, o candidato Ciro Gomes (PDT) utilizou um vídeo de deepfake para ironizar seu adversário, o então presidente Jair Bolsonaro. No post no Twitter, Ciro usou uma cena da série de filmes “Esqueceram de Mim,” onde o gorro do vilão pega fogo, fazendo alusão a uma afirmação de Bolsonaro sobre seu ministro da Educação, Milton Ribeiro, que havia sido preso naquele dia.

Os vídeos de deepfake têm um grande potencial para enganar pessoas menos familiarizadas com a internet e aquelas que não a utilizam frequentemente. Isso ocorre porque esses vídeos muitas vezes vêm com um viés de confirmação, ou seja, o conteúdo é criado para se alinhar com as crenças e expectativas de um determinado público, tornando-o mais convincente para aqueles que já estão predispostos a aceitar a mensagem apresentada.

Punição para Eleições 2024

O TSE aprovou resoluções que vão disciplinar as Eleições Municipais de 2024. A novidade é a regulamentação do uso da inteligência artificial (IA) na propaganda eleitoral.

  • Foram aprovadas a proibição de deepfakes; a obrigação de aviso sobre o uso de IA na propaganda eleitoral; a restrição do emprego de robôs; e a responsabilização das big techs que não retirarem do ar, imediatamente, desinformação, discurso de ódio, ideologia nazista e fascista, além dos antidemocráticos, racistas e homofóbicos.
  • Se candidata ou candidato usar deepfake (conteúdo em áudio ou vídeo, digitalmente manipulado por IA), poderá ter o registro ou o mandato cassado.
  • Provedores e plataformas serão considerados solidariamente responsáveis, civil e administrativamente, quando não removerem imediatamente conteúdos e contas durante o período eleitoral.

Orientações a cidadãs e cidadãos

O TSE, em parceria com o Tribunal de Contas da União (TCU), divulgou dicas para que cidadãs e cidadãos identifiquem e não repassem narrativas enganosas.

  • O primeiro passo é desconfiar da informação e buscar mais detalhes sobre o tema e quem produziu o conteúdo. E verificar se há outras fontes confiáveis.
  • Conferir também a data de veiculação. A informação pode ter circulado fora da data ou no contexto errado.
  • Notícias falsas costumam ter erros de português e usar abordagem sensacionalista, com forte apelo emocional.
  • Certifique-se que o conteúdo não é uma deepfake. Essa tecnologia é usada para distorcer a realidade, alterando ou criando imagens e até a voz de uma pessoa.

Fonte: Jornal Opção.

 

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